quinta-feira, 31 de maio de 2012

O bolo do fim do mundo


                                      



Depois de algum tempo o interfone tocou:

- Oi, quem aí?
- É o encanador.
- Ufa! Ainda bem que você chegou...
- Qual é o problema da pia?
- Entupida? - sorri.

     Me lembrei exatamente do dia em que tudo aconteceu e deixo uma única mensagem: não ouse fazer bolos que o prazo de validade vencerá no dia do fim do mundo, 21/12/12, bolos assim tem que morrer junto o mundo e, de fato, bolos que pegamos amor antes mesmo deles estarem prontos só nos causam dor - a saber, pias estupidas. Era uma noite cansativa e divertida. De um lado o saquinho de massa pronta, do outro a vasilha com os três ovos, duas colheres de manteiga e 250ml de leite. Aquele seria o bolo dos bolos! - pensei. O bolo mais genial e o bolo mais bolo de todos os bolos... Certamente, não haveria paisagem mais bonita na minha cabeça do que: o meu bolo do fim do mundo pronto e sendo partido para todos que na casa habitavam e a visitavam. Estaria tudo lindo se não fosse o fato de que não se deve fazer bolos com leite vencido. Debrucei-me em lágrimas sobre aquela massa injuriada. Em cada fio que ia escorrendo para dentro do ralo, cada peça da imagem ia se desmanchando. Pode alguém ficar tão triste assim por causa de uma droga de bolo com leite vencido? Oras.

- Moça?
- Opa!
- Eu vou desentupir, não precisa ficar assim. Só me diga, tem algo que você acha que possa ter causado o entupimento? Um osso de galinha? Macarrão? Até mesmo algo muito gorduroso, massa de bolo?

      Pensei comigo. Não iria denunciá-lo, não assim, para aquele homem que eu mal conhecia. Aquele ser não havia nem se quer um nome além de “bolo do fim do mundo”, ainda mais porque fui eu quem o estraguei.

- Moço, eu joguei uma massa de bolo aí.
- Explicado. Não faça mais isso.

      Fiquei ali, ouvindo aquele barulho insistente e aquela mangueira adentrando pelo orifício gigantesco daquela pia sem redinha e tentando, em vão, segurar cada lágrima que dizia que eu havia traído aquele bolo mais uma vez. Depois das lágrimas, tive que explicar ao moço a história do bolo do fim do mundo...

- Ah! Pense bem, se ele não descesse desta forma por este ralo ele desceria de qualquer forma por outro...

sexta-feira, 25 de maio de 2012


    Silênc. Silê. Sil. Eram três, cobertos por isto e afundados nisto. Silêncio era a melodia da ocasião. É o que tem para hoje. Era a frase que rodava de trás pra frente e de frente para trás nas cabecinhas enroladas dos meninos. Ora vida, ora vira. O relógio não conseguia girar mais de 360° que um gritava com os olhos: chega... Sem exclamações e com as reticências da ocasião. É o que tem pra agora, chega. E o silênc vinha e dizia que valia a pena seguir mais um pouco, mais um pouco ou até o próximo chega.
   Chega. Chega. Chega. Eram três, cobertos de “chegas” enfiados no ciclo e ninados pelo silêncio de uma canção muda. Eram três irmãos, o mais velho, o mais novo e o do meio. O mais velho desistiu do silêncio e aumentou o passo e como nunca tinha ouvido nada, só ouviu dizer por ai que existia o tal dizer, mas como nunca disse acelerou o passo. Passo. Passo. Passo. Passaram-se três giros do relógio e quem podia ouvir ouviu o barulho dos seus calçados com passadas rápidas para a eternidade.
    O mais novo aguentou mais tempo que o mais velho e menos que o do meio. Foi até o dia em que suas pernas saíram cambaleando em “S” e seus lábios desajeitados tentaram representar a esta mesma letra na esperança de que saisse uma gargalhada. Quem podia ouvir ouviu o som estridente do seu quase riso e era tão bonito que dava de se deixar cair uma quase lágrima.
    O mais novo encarou a melodia da ocasião, puxou a varinha e catou no chão as letrinhas. Por mais que aqueles símbolos não fizessem para ele nenhum sentido ele viu que b era p e que poderia ser q, se a gente virasse a cabeça. Juntou o q com o p que virou um... Multiplicou o v por dois e fez o w, depois o virou e fez um m. Já com o riso do irmão do meio no rosto ele levantou e deu os passos do irmão mais velho. É o que tem pra hoje - disse ele. Quem podia ouvir não ouviu, mas quem podia ver viu quando as suas perninhas agacharam, seus braços agarraram às letrinhas e quando o riso solidificou em seu rosto. Era tão bonito que era de se deixar cair uma lágrima. Então, o silêncio o levou para a eternidade...




quinta-feira, 24 de maio de 2012

(...) e aqui eu gostaria de ser capaz de lhe contar a metade das coisas que Alice costumava dizer a partir da sua expressão favorita: "vamos fazer de conta".

(Lewis Carrol, capítulo 1, p. 163)




segunda-feira, 14 de maio de 2012



virei o b de ponta a cabeça
com o giro caíram umas gotinhas
do tempo que passou e ficou




quinta-feira, 10 de maio de 2012

Eva



Eva, Eva
teu nome condiz com Minerva
por não lembrar pecado e sim flor
Eva, Eva
teu nome me diz leva
leva a flor